segunda-feira, março 07, 2005

1930

A década de 30 do século XX é fabulosa. O look dos 30's é qualquer coisa. E não há nada tão maravilhoso como a década de 30 britânica. Semprei considerei que havia algo de fantasmático entre o glamour daqueles anos e a emergência daquele mal absoluto que iria culminar com a Grande Guerra. Um mal produzido por um dos países mais cultos do mundo. É, a cultura não evita nada. De qualquer modo, tudo isto aparece a propósito do filme "Being Julia". Não que seja um grande filme, nem é isso que está em questão, o que me agradou foi o seu poder evocativo sobre os anos 30 ingleses. O academismo sempre casou muito bem com a snobbery inerente a uma certa espécie de casta anglo-saxónica que esteve no seu pico nessa altura. Li algures que a civilização britânica se extinguiria à míngua de afectos verdadeiros. Seja. Mas fazem-no como ninguém. A presença de Jeremy Irons no elenco trouxe-me à memória outro avatar da "British Quality", seja isso o que for: a série "Brideshead Revisited", que será sempre um símbolo de britishness até ao fim bárbaro dos tempos. Mesmo tendo em conta que, não fora a voz de Jeremy Irons, tudo aquilo seria uma estucha insuportável. Mas, adiante. O academismo funciona como o complemento perfeito para este look. Aí residem os limites da questão. O academismo é aborrecido. E o aborrecimento é fatal. Ninguém lhe sobrevive. Por isso é que sempre me fascinou o conceito de pegar no embrulho académico do cinema e fazê-lo explodir em todas as direcções, mas sempre sem perder o brilho, a reserva, a distância, o spleen do cavalheiro a observar o mundo por entre a névoa da margem oposta. Imaginem o James Ivory a filmar como o Tarantino. Por aí. O "Maurice" via Tarantino/Avary, com passagem por Gregg Araki. Era como juntar num mesmo ramalhete Cronenberg, Lynch, Fincher, Visconti, Frears e Pasolini. O que poderia sair disso? Enquanto estava a ver o filme não parava de pensar: Rebentem com essa merda toda...". E depois, foi um partir de coração ver aquele pequeno Tom Sturridge a fazer de filho de Ms. Bening, com aquela expressão neutra, fria, aborrecida, britânica. Aquela criança merece um monumento e um grande realizador, num daqueles papéis para ficar para sempre. Anos 30, casas de campo, Bentleys descapotáveis, fatos de tweed, morangos com champanhe e tudo o mais. E muita ambiguidade à mistura, sexual, moral, social e... e... e.... Enfim!

Ontem estive a ouvir Bowie, às duas da manhã, a caminho de casa. Curiosamente, ou talvez não, o que ouvi foi o Bowie dos anos 80, quando a musa começou a falhar. Gosto da decadência das estrelas. Má música de um génio. O que pode haver de melhor? Mesmo assim, amo profundamente o "Loving the Alien" e a versão dos Pet Shop Boys para "Hallo Spaceboy". A mistura parece-me adequada.

Leitura de dinamite: "Quarteto" de Heiner Müller. Mal posso esperar por ver aquelas palavras em palco. Apetece dizê-las, só porque sim. Espero que aquelas duas almas se deixem possuir. Para nosso (e deles, claro) deleite...

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