sexta-feira, março 18, 2005

A espera é uma forma menor de Arte

Sou uma má pessoa, suponho. Ontem tive a certeza de que as minhas elaborações psico-dramáticas sobre as pessoas resultam. Foi o triunfo, a um tempo assustador e magnífico, de uma imagem que eu tinha criado sobre alguém. Tremi de prazer e triunfo. E assustei-me com o que senti e com as consequências disso. Não há nada mais aterrador do que ter razão sobre determinadas coisas. Por vezes temo que o excesso de oportunidades possa ser fatal para a vida de uma pessoa, em especial se essa pessoa for jovem, bela e disponível para o mundo. Não quero ter razão nisso. Em absoluto. Quero saber o que se vai passar, mas tenho medo. Porque sei o que acontece quando, após muito procurar, se encontra aquela porta no chão que nos permite passar para o outro lado e descobrir uma coisa tão bela quanto terrível: o nosso lugar no mundo. Foi isso. E todas as criaturas belas e jovens e disponíveis acabam por o fazer. O problema é que, depois, não se sabe o que fazer com essa informação e com essa certeza. Olhei de longe, e lá do alto, para aquela silhueta e vi tudo com tanta clareza que gelei. Sei o que se vai passar. Porque quem sente muito, sofre muito e faz todas as asneiras e todas as trapalhadas. Porque se sente, porque é assim que se vive. Quis dizer isso mesmo. Mas não posso. Só Deus. Seja ele quem for. E como o nosso Deus é uma criatura ausente e ocupada, não auguro nada de bom... Seja.

Marcado no corpo jovem o sinal de pertença a um grupo, a uma realidade, a uma esperança. Vou fazer tudo para que isso aconteça. Penso que, de quando em vez, aparece uma alma que vale a pena salvar, acarinhar, tornar nossa e fazê-la voar. Sei fazer isso muito bem. E não quero perder esse gosto, esse prazer solitário, de Deus privado, de moldar esse pequeno tesouro que é um princípio. Todos os princípios do mundo deviam ser tratados como coisas frágeis e belas.

Espero por não sei bem o quê. Realizo-me em boas obras em nome de um qualquer karma que sei não poder cumprir. Mas é o que me resta. E já não é mau. Tenho sido muito elogiado por incutir nos outros todos os princípios que tento destruir em mim. Ironia suprema. Será que ver os outros fazerem o que detesto é mais um passo no caminho para... o quê? Já não quero saber. É a espuma das horas, a poeira dos dias: olá, estou aqui, existo. Não sei mais que isto.

O cabeça no mar vai trazer-me uma compilação dos Imagination. Pois. Prazeres ocultos e pecaminosos dos 80's para consumo solitário. My Own Private Idaho.

Rock'n'roll. Deal with it...

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